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sábado, 24 de fevereiro de 2018

A História Mal Contada


A partir do impeachment em 2016, observa-se no Brasil um acirramento das disputas doutrinárias. Elas excederam os espaços políticos partidários e se capilarizaram nos espaços rotineiros, em especial nas redes sociais. Com efeito, é possível verificar um certo fluxo na educação política do brasileiro comum, em que pese este tenha sido gerado em ambientes não formais de conhecimento.  Em decorrência desse avivamento da cidadania, velhos baús da história do Brasil voltaram a ser vasculhados, oportunizando, assim, a popularização de temas antes sob monopólio acadêmico. Um dos debates mais controversos tem sido sobre o, até então solapado, período do Governo Militar. Os intelectuais, que privatizaram o discurso, veem-se agora de frente com um público estendido, na sua maioria jovem, ávido por saberes dissemelhantes.

Nas mídias, especialistas repetem a mesmice discursiva sobre o regime de governo no interstício 1964/85, tese que hoje já permite uma comparação entre os dois governos. Poderíamos avançar, por exemplo, escrutinando conceitos como autoritarismo e democracia. Atenhamo-nos apenas a três categorias comparativas.

Assassinatos perpetrados pelo Estado. Segundo o IPEA, somente em 2015 foram registradas mais de 3 mil mortes decorrentes de intervenção policial e cerca de 500 policiais foram assassinados no exercício da função. As polícias brasileiras lidam diuturnamente com condições desumanas de trabalho. Ao mesmo tempo, a Comissão da Vergonha, digo, da Verdade, instituída no governo Dilma, conseguiu identificar 224 mortos e 210 desaparecidos durante todo o período do regime militar. Não foram encontradas provas que pudessem punir criminalmente algum militar. A Comissão encerrou as atividades em meio a denúncias de mau uso de recursos públicos, e era conhecida pelo codinome de Equipe Ninja. Não vamos aprofundar o tema, mas é necessário lembrar que ocorrem no país mais de 60 mil assassinatos anuais, cuja causa é a criminalidade fomentada pela política.

Torturas atribuídas ao Estado. Dados do Infopen (2014),indicam uma população carcerária de 622 mil presos alocados em 371 mil vagas no país. Cerca de 40% dos apenados esperavam julgamento. Nessas condições, o Estado perdeu o controle do sistema prisional. As consequências são consecutivas rebeliões, chacinas, decapitações de presos e assassinatos de agentes penitenciários. As prisões brasileiras são hoje verdadeiras zonas de torturas. Por outro lado, não se sabe ao certo o número de “perseguidos” sob o Regime Militar. Algumas das vítimas têm hoje nomes públicos, como FHC, Dilma Rousseff, José Serra, Caetano Veloso e Chico Buarque. Todos muito bem-sucedidos profissionalmente e economicamente. Todos progrediram no exílio – FHC foi, inclusive, aposentado pelo Regime "repressivo", aos 38 anos de idade.

Censura.  No Regime Militar, a observância da ordem pública e o combate ao terrorismo foi caracterizada de repressão. Neste ínterim, citam-se apenas dois exemplos atuais: 1) o escândalo do caixa 2 descortinou a falácia das eleições democráticas. Com doações bilionárias, amparadas na corrupção e na criminalidade, as eleições no Brasil sempre foram inegavelmente fraudadas e o fato ocultado; 2) no meio acadêmico, oportunidades e carreiras foram e ainda são ceifadas conforme a orientação ideológica do docente. Isso ocorre de forma análoga com a publicação de artigos científicos e solicitações de recursos aos órgãos de pesquisa– quem não se adéqua ao progressismo de esquerda, está fora. Nos últimos anos, a produção da informação e do conhecimento no Brasil tem como matéria prima fundamental as vísceras dos seus gestores.
Isso denota democracia?
Pense bem!